Acredito que hoje Portugal ganhe à Dinamarca e creio que a Holanda vai ganhar à Alemanha. O que vai dar uma salada russa daquelas!
E, como se diz por cá, até ao lavar dos cestos é a vindima!
Esta carta de Mourinho devia ser lida por todos para dizermos a uma só voz:
FORÇA PORTUGAL!
ATÉ OS COMEMOS!
CARTA DE MOURINHO À SELECÇÃO NACIONAL
Sou português há
47 anos e treinador de futebol há dez. Sendo assim, sou mais português do que
treinador. Posto isto, para que não restassem dúvidas, vamos ao que importa...
As Selecções Nacionais não são espaços de afirmação pessoal, mas sim de
afirmação de um País e, por isso, devem ser um espaço de profunda emoção
colectiva, de empatia, de união. Aqui, nas selecções, os jogadores não são
apenas profissionais de futebol, os jogadores são além disso portugueses comuns
que, por jogarem melhor que os portugueses empregados bancários, taxistas,
políticos, professores, pescadores ou agricultores, foram escolhidos para
lutarem por Portugal. E quando estes eleitos a quem Deus deu um talento se
juntam para jogar por Portugal, devem faze-lo a pensar naquilo que são - não
simplesmente profissionais de futebol (esses são os que jogam nos clubes), mas,
além disso, portugueses comuns que vão fazer aquilo que outros não podem fazer,
isto é, defender Portugal, a sua auto estima, a sua alegria. Obviamente há
coisas na sociedade portuguesa incomparavelmente muito mais importantes que o
futebol, que uma vitória ou uma derrota, que uma qualificação ou não para um
Europeu ou um Mundial. Mas os portugueses que vão jogar por Portugal - repito,
não gosto de lhes chamar jogadores - têm de saber para onde vão, ao que vão,
porque vão e o que se espera deles. Por isso, quando a Federação Portuguesa de
Futebol me contactou para ser treinador nacional, aquilo que senti em minha casa
foi orgulho; do que me lembrei foi das centenas e centenas de pessoas que, no
período de férias, me abordam para me dizerem quanto desejam que eu assuma este
cargo. Isto levou-me, pela primeira vez na minha vida profissional, a decidir de
uma forma emocional e não racional, abandonando, ainda que temporariamente, um
projecto de carreira que me levou até onde me levou. Desculpem a linguagem, mas
a verdade é que pensei: Que se lixem as consequências negativas e as críticas se
não ganhar; que se lixe o facto de não ter tempo para treinar e implementar o
futebol que me tem levado ao sucesso; por Portugal, eu vou! E é isto que eu
quero dizer aos eleitos para jogar por Portugal: aí, não se passeia prestigio;
aí, não se vai para levar ou retirar dividendos; aí, quem vai, vai para dar; aí,
há que ir de alma e coração; aí, não há individualidades nem individualismos;
aí, há portugueses que ou vencem ou perdem, mas de pé; aí, não há azias por
jogar ou por ir para o banco; aí, só há espaço para se sentir orgulho e se ter
atitude positiva. Por um par de dias senti-me e pensei como treinador de
Portugal. E gostei. Mas tenho que reconhecer que o Real Madrid é uma instituição
gigante, que me «comprou» ao Inter, que me paga, e que não pode correr riscos
perante os seus sócios e adeptos. Permitir que o seu treinador, ainda que por
uns dias, saísse do seu habitat de trabalho e dividisse a sua concentração e as
suas capacidades era impensável. Creio, por conseguinte, que o feedback que saiu
de Madrid e chegou à Federação levou a que se anulasse a reunião e não se
formalizasse o pedido da minha colaboração. Para tristeza minha e frustração do
presidente Gilberto Madail. Mas, sublinho, agora já a frio: foi e é uma decisão
fácil de entender. Estou ao leme de uma nau gigantesca, que não se pode nem se
deve abandonar por um minuto. O Real decidiu bem. Fiquei com o travo amargo de
não ter podido ajudar a Selecção, mas fico com a tranquilidade óbvia de quem
percebe que tem nas suas mãos um dos trabalhos mais prestigiados no mundo do
futebol. Agora, Portugal tem um treinador e ele deve ser olhado por todos como
«o nosso treinador» e «o melhor» até ao dia em que deixar de ser «o nosso
treinador». Esta parece-me uma máxima exemplar: o meu é o melhor! Pois bem, se o
nosso é Paulo Bento, Paulo Bento é o melhor. Como português, do Paulo espero
independência, capacidade de decisão, organização, modelagem das estruturas de
apoio, mobilização forte, fonte de motivação e, naturalmente, coerência na
construção de um modelo de equipa adaptada as características dos portugueses
que estão à sua disposição. Sinceramente, acho que o Paulo tem condições para
desenvolver tudo isso e para tal terá sempre o meu apoio. Se ele ganhar, eu,
português, ganho; se ele perder, eu, português, perderei. Mas eu também quero
ganhar. No ultimo encontro de treinadores que disputam a Champions League,
quando questionado sobre o poder dos treinadores nos clubes, ou a perda de poder
dos treinadores face ao novo mundo do futebol, sir Alex Fergusson disse (e não
havia ninguém com mais autoridade do que ele para o dizer!) que o poder e a
liderança dos treinadores depende da personalidade dos mesmos, mas que depende
muitíssimo das estruturas que os rodeiam. Clubes e dirigentes fragilizam ou
solidificam treinadores. Eu transponho estas sábias palavras para a selecção
nacional: todos, mas todos, neste país devem fazer do treinador da selecção um
homem forte e protegido. E quando digo todos, refiro-me a dirigentes
associativos, federativos e de clubes, passando pelos jogadores convocados e
pelos não convocados, continuando pelos que trabalham na comunicação social e
terminando nos taxistas, políticos, pescadores, policias, metalúrgicos, etc.
Todos temos de estar unidos e ganhar. E se perdermos, que seja de pé. Mas,
repito, há coisas incomparavelmente mais importantes neste país que o futebol.
Incomparavelmente mais importantes¿ Infelizmente! Aproveito esta oportunidade
para desejar a todos os treinadores portugueses, aos que estão em Portugal e aos
muitos que já trabalham em tantos países de diferentes continentes, uma época
com poucas tristezas e muitas alegrias. Ao Xico Silveira Ramos, manifesto-lhe a
minha confiança no seu cargo de Presidente da ANTF.
Um abraço a todos. José
Mourinho
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