No domingo, depois de arrumar a cozinha, em vez da
habitual paragem no sofá para fazer zapping pela deprimente televisão nacional
(ao domingo à tarde) decidi que haveria de ir levar a reciclagem ao centro da
vila do Luso.
Esquecendo-me de que era domingo, depois de “despejada”
a reciclagem no seu devido lugar, decidi que iria à Fonte de São João encher
cinco garrafões de água, apenas cinco.
Ao leitor do Luso passo a explicar as razões porque
fui à fonte buscar água (não é muito habitual ver por lá alguém do Luso):
1º - a água de minha casa é de furo e prefiro beber a
da fonte (questões de segurança);
2º - é mítico o gesto de ir à fonte buscar água;
3º - curiosidade em apreciar a fonte num domingo à
tarde.
Não era verão, mas o tempo estava ameno.
Cheguei com os meus cinco garrafões na mão e havia…
FILA!
CONSTATAÇÕES:
1.
Eram imensos os rótulos espalhados pelo chão e
presos nas grades por onde escorre a água;
2.
As pessoas acotovelavam-se para encher mais
garrafões que o vizinho e havia mesmo quem estivesse com garrafões em três
bicas. Ou seja, duas mãos a controlar três garrafões a encher de cada vez;
3.
Os garrafões vazios que estavam à espera de
encher (à exceção dos meus) eram de todas as marcas menos do Luso ou do
Cruzeiro. Reinava Mini-Preço, Continente e Pingo Doce;
4.
O que mais se ouve é: “Leva, leva! Ali, ali…
corre! Vai ao carro, mas vai depressa e volta para buscar mais!”
Embora estagnado, perplexo e até um pouco anestesiado
com tamanha insensatez, continuei impávido e sereno a assistir à “comédia” até
que fui “ultrapassado”. Do alto dos seus sapatos altos e das suas gangas
justas. A senhora que desceu as escadas apressadamente, em jeito de corrida,
olhando para trás e dizendo ao marido barrigudo e de bigode que corresse, não
viu a fila, não respeitou a espera dos outros e com sorrisinho malandro (à
tuga) esgueirou-se para a bica que há 2 segundos tinha ficado livre. A bica que
era (ou ia ser) minha!
O cúmulo: olhou para mim, de alto a baixo. Virou a
cabeça ao chão. Não satisfeita, voltou a olhar para mim e de novo o sorrisinho
malandreco a dizer-me: “fui espertalhona!”
A isto apenas consegui abrir a boca e responder: “nunca
viu um fato de treino com um homem lá dentro?”
Fiquei incrédulo. O senhor de bigode lá chegou.
Esperou que os garrafões enchessem. Arrancou o resto de um rótulo que já estava
pendurado, deitou-o ao chão e acartou com os garrafões. Os saltos altos
seguiram-no, não sem antes voltar a dar o sorrisinho maroto ao tipo de fato de
treino: “fui espertalhona!”
Enchi os meus garrafões e no caminho para casa vinha
a pensar em ideias (perigosas) para solucionar tamanha insânia na fonte de São
João, no Luso. Aqui ficam algumas dessas ideias (perigosas ou estúpidas):
1.
Criar um cerco à fonte e colocar um fiscal que
atribuiu senhas aos “esfomeados por água” e um número mínimo de garrafões a
encher. Mas, quem pagaria este senhor? A junta, a câmara, os parquímetros que
não existem nos estacionamentos que circundam a fonte, etc…
Este mesmo
fiscal aplicaria multas a quem deixasse rótulos no chão ou garrafas e garrafões
abandonados…
2.
Libertar duas bicas (as das pontas, por exemplo)
para que os turistas possam encher a sua garrafa e/ou beber água na palma da
mão;
3.
Obrigar os “esfomeados por água” a receberem
cinco minutos de formação de boas maneiras, valores e boa educação.
Esta última será, sem dúvida, a mais necessária, mas
aquela que deveria também ser a mais dispensável, porque afinal de contas todos
devemos ir adquirindo, à medida que crescemos, boas maneiras, valores e boa
educação.
As ideias são perigosas, mas alguma coisa há a fazer
naquele local. Quem tiver ideias melhores que as apresente e as implemente.
A grande conclusão que tirei, e com efeitos imediatos
a partir de agora: seja verão ou inverno, ir buscar água à Fonte de São João,
no Luso, para beber em casa, nunca ao domingo e sempre depois das 20h.
Para ver selvagens, escolho outro sítio!
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